ARTIGOS ORIGINAIS
NOVO MÉTODO PARA TRATAMENTO DA ANGIODISPLASIA DE CÓLON
New Method of Treating Colonic Angiodysplasia
AntÔnio HilÁrio Alves FREITAS - TSBCP1, Derival Nelmo dos SANTOS1, CÁssia de Melo TODESCHI1, SÉrgio Aparecido VITAL1, Kanthya Arreguy de Sena BORGES1, PatrÍcia Ribeiro de BABO2
1Oficiais Médicos do Serviço de Endoscopia Digestiva; 2Médica Residente do Serviço de Endoscopia Digestiva.
RESUMO: A utilização da colonoscopia como método de diagnóstico e tratamento possibilitou avanços na abordagem da angiodisplasia de cólon, anomalia vascular responsável por um terço das hemorragias gastrointestinais baixas. Trata-se de paciente com 65 anos, insuficiência renal crônica dialítica e coronariopata grave, apresentando episódios de hematoquezia volumosa ao iniciar uso de agregantes plaquetários, necessitando múltiplas hemotransfusões. Colonoscopia diagnosticou lesões vasculares no ceco, onde existe grande risco de perfuração durante intervenções terapêuticas. Há descrições na literatura do uso de agentes hemostáticos tais como plasma de Argônio e vasoconstrictores, aplicados separadamente. Foi realizado tratamento endoscópico das angiodisplasias com aplicação de Argônio, após elevação das lesões com soro fisiológico, e pela primeira vez descrita no Brasil, acrescentado vasoconstrictor à solução.
Descritores: Colonoscopia, Angiodisplasia, Cólon. Argônio.
INTRODUÇÃO
As anomalias vasculares de cólon são
causas freqüentes de hemorragia digestiva baixa
1.
A colonoscopia utilizada como método terapêutico vem alcançando bons resultados tanto
em neoplasias, quanto nos sangramentos do trato gastrointestinal
2.
O caso descrito é de um paciente com 65
anos de idade, comorbidades graves, apresentando
episódios de hematoquezia volumosa ao iniciar uso
de antiagregantes plaquetários. Colonoscopia
diagnosticou lesões vasculares aracneiformes com sinais
de sangramento, localizadas no ceco.
O tratamento endoscópico das anomalias vasculares do cólon, com hemostasia utilizando
soluções (soro fisiológico, esclerosantes) ou métodos
térmicos (cautérios, Argônio) já foi descrito
anteriormente no Brasil. No presente trabalho, foi
adicionado vasoconstrictor à solução no intuito de estender o
tempo de elevação das lesões e aumentar a
segurança durante a aplicação do Argônio (primeiro relato
nacional desta associação de agentes hemostáticos no
intestino grosso).
RELATO DE CASO
Trata-se de paciente com 65 anos, sexo masculino, tabagista, hipertenso, portador de
insuficiência renal crônica dialítica e coronariopatia grave.
A possibilidade de transplante renal somente poderia ser avaliada após realização de
angioplastia coronariana. No entanto, apresentava episódios
de hematoquezia volumosa ao iniciar uso de
antiagregantes plaquetários, essenciais após
intervenções hemodinâmicas.
Internado no Hospital da Polícia Militar de
Minas Gerais com quadro de hematoquezia volumosa e anemia. A endoscopia digestiva alta sem alterações.
O exame proctológico com retossigmoidoscopia
mostrou grande volume de sangue no reto. A colonoscopia
diagnosticou lesões angiodisplásicas no ceco.
Visando terapêutica futura da coronariopatia e o
conseqüente uso de antiagregantes plaquetários, o paciente foi
encaminhado para terapêutica das lesões vasculares
do cólon.
Foi realizado tratamento endoscópico de
duas angiodisplasias localizadas no ceco, elevando-as
com solução fisiológica acrescida de
vasoconstrictor (adrenalina 1:200.000), 3 a 5 ml injetados com
catéter endoscópico, adjacente às anomalias, e a seguir,
empregado plasma de Argônio (ARGON 4 _ WEM
Equipamentos Elétricos LTDA _ Ribeirão Preto / S.P.)
utilizando corrente de 40 W e fluxo de gás de 3 L,
em pulsos repetidos de 1 segundo de duração, até
completa fulguração dos vasos.
Ato sem intercorrências, paciente apresentando boa evolução, recebendo alta hospitalar no
dia seguinte, sem manifestação clínica ou
laboratorial de ressangramento e com melhora da anemia
durante os 90 dias subseqüentes, momento desta
publicação.
DISCUSSÃO
As anomalias vasculares do cólon são
causas freqüentes de sangramento gastrointestinal,
responsáveis por um terço das hemorragias
gastrointestinais baixas 1. Predominam na população entre 60-70
anos de idade e acometem igualmente ambos os
sexos. Constitui achado incidental na maioria dos casos,
e apenas merecem ser tratadas quando maiores que 8 mm e/ou apresentarem sinais de sangramento.
Quando são causas de sangramento e não recebem
tratamento, 85% ressangram nos próximos 20 meses
2. Em sua grande maioria localizam-se nos
segmentos proximais do cólon, e situam-se na
camada submucosa. Em pacientes com insuficiência renal,
é a principal causa de sangramento intestinal baixo
recorrente 3.
A colonoscopia é o melhor método para
diagnóstico de anomalias vasculares de cólon.
O avanço na terapêutica endoscópica
possibilitou abordagem da angiodisplasia intestinal. Vários
métodos têm sido utilizados para hemostasia,
tais como: injeção de soluções na submucosa (soro
fisiológico, esclerosantes, vasoconstrictores);
e métodos térmicos (cautérios monopolar e
bipolar, gás Argônio) 4, 5, 6, 7, 8,
9.
A predominância das lesões no cólon
direito significa risco maior de complicações no
tratamento das anomalias vasculares. A parede do intestino
neste segmento é muito fina e perfura-se mais
facilmente, principalmente quando se utiliza método térmico
para alcançar a camada submucosa que requer
aplicação de maior quantidade de energia.
Anteriormente eram utilizadas
soluções esclerosantes e vasoconstrictores injetados junto
às lesões, obtendo-se sucesso, mas com grande índice
de recorrência. Com a incorporação do Argônio a
partir da década de 90, tornou-se o método de escolha para
o tratamento das anomalias vasculares do sistema
digestivo 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16.
O plasma de Argônio, por não ser método
de contato direto, tem sido o muito utilizado no
tratamento de lesões do trato gastrointestinal (esôfago de
Barret, varizes, pólipos). Nas patologias gastroesofágicas
apresenta-se como alternativa segura, já que tais
segmentos possuem parede muito espessa, com risco
menor de perfuração, apesar de alguns casos descritos
16. No intestino grosso, principalmente em cólon direito,
utiliza-se como artifício a confecção de uma bolha de
solução fisiológica junto à lesão vascular para
aplicação do Argônio (Figura 1).
Figura 1 - Bolha contendo solução de vasoconstrictor, aplicada
próximo à anomalia vascular, no ceco. |
Figura 2 - Local após aplicação de vasoconstrictor e plasma de
Argônio. |
Key words: Colonoscopy, Angiodysplasia, Colon, Argon.
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Endereço para correspondência:
Antônio Hilário Alves Freitas
Rua Paracatu, 838 / 206 - Barro Preto
30180.090 - Belo Horizonte - Minas Gerais
Telefone e FAX: 31-3337.9988 Celular: 31-9956.1363
E-mail: hilariofreitas@ig.com.br
Recebido em 27/07/2009
Aceito para publicação em 01/10/2009
Trabalho realizado no Hospital da Polícia Militar de Minas Gerais.