ARTIGOS ORIGINAIS
A RELAÇÃO ENTRE METÁSTASES EM LINFONODOS REGIONAIS E FATORES PROGNÓSTICOS NO ADENOCARCINOMA ESPORÁDICO DE INTESTINO GROSSO
The Relation Between Metastases in Regional Lymph Nodes and Prognostic Factors in the Sporadic Adenocarcinoma of the Large Bowel
Bianca Cecchele Madeira1; Karla Lais PÊgas2;ClÁudio Galeano Zettler3; Eduardo Cambruzzi4
1Acadêmica de Medicina da Universidade Luterana do Brasil - ULBRA; 2 Médica Patologista - Santa Casa de Porto Alegre - RS; 3 Médico Patologista - Doutor em Anatomia Patológica e Citopatologia - Santa Casa de Porto Alegre - RS, Professor Adjunto de Patologia da ULBRA; 4 Médico Patologista - Doutor em Anatomia Patológica e Citopatologia - Professor Adjunto de Patologia da ULBRA.
RESUMO: Introdução: O carcinoma colorretal corresponde a uma das neoplasias malignas mais frequentes no Brasil, sendo a terceira causa de óbito em mulheres e a quinta em homens. Determinadas características histopatológicas do tumor, como grau, tamanho e presença de metástases, podem ser correlacionadas com o tempo de sobrevida livre de doença. Objetivo: avaliar a associação entre metástases em linfonodos regionais e características histopatológicas no adenocarcinoma colorretal. Método: Foram avaliados cinqüenta espécimes de colectomia por adenocarcinoma no laboratório de patologia da Ulbra entre 2006 e 2008, sendo determinados os seguintes dados: topografia, tamanho tumoral, configuração macroscópica, grau histológico, borda microscópica, presença de metástases linfonodais e estadiamento (TNM, Dukes e Astler-Coller). Resultados: a idade média correspondeu a 63,7 anos, com predomínio em mulheres (n=26-52%) e no cólon esquerdo / reto (n=29_58%). Não houve associação entre a presença de metástases nodais e idade (p=0,802), sexo (p=0,786), borda microscópica (p=0,180), presença de áreas mucoprodutoras (p=0,860), grau de diferenciação (p=0,068) e tamanho tumoral (p=0,987). Conclusão: No adenocarcinoma colorretal, a presença de metástases em linfonodos não está associada ao tamanho tumoral, bordas microscópicas e grau histológico, sendo necessária a avaliação de novos fatores, possivelmente eventos moleculares, para predizer a presença de metástases nodais.
Descritores: Adenocarcinoma, Cólon; Linfonodo, Patologia.
INTRODUÇÃO
O carcinoma colorretal corresponde a uma das neoplasias malignas mais freqüentes no Brasil,
sendo a terceira causa de óbito em mulheres e a quinta
em homens, embora estas taxas sejam maiores na
América do Norte e Europa (1). Estudos epidemiológicos
indicam que a etiologia do adenocarcinoma de
intestino grosso está associada a fatores genéticos e
ambientais, como a dieta. A maioria dos pacientes, em áreas
de risco, apresenta mais de 50 anos de idade no
momento do diagnóstico. A incidência do
adenocarcinoma colorretal é levemente maior no sexo masculino,
acometendo em 40% dos casos o reto, em 30% dos
casos o cólon esquerdo e em 30% o cólon direito. Em
mulheres, há um predomínio de lesões no cólon direito
(1,2,3,4,5).
Uma grande proporção de casos
adenocarcinoma colorretal está relacionado à presença concomitante
de adenomas, além da eventual associação com a
polipose intestinal familiar, doença inflamatória intestinal
crônica, esquistossomose, polipose juvenil e irradiação
pélvica prévia. A apresentação clínica da neoplasia é
influenciada pela topografia. As lesões do reto estão
associadas à enterorragia e tenesmo. Nas lesões do
cólon esquerdo, pode haver alteração do hábito intestinal
e obstrução. Pacientes com tumores do cólon
direito podem apresentar anemia devido à perda
sanguínea crônica. Durante a progressão do
adenocarcinoma colorretal, há invasão neoplásica através das
camadas do intestino, incluindo invasão
neoplásica angiolinfática, podendo levar ao surgimento
de metástases hepáticas e nodais
(5,6,7,8).
A maioria dos casos de adenocarcinoma de intestino grosso apresenta mais freqüentemente a
forma ulcerada, de borda algo elevada, podendo
haver lesões anulares ou não, e sendo mais freqüentes
no cólon esquerdo. Lesões polipóides e/ou vegetantes
são menos comuns, aparentemente associadas a um
curso clínico menos agressivo, sendo mais comuns no
cólon direito. Cerca de 10% dos casos carcinoma
colorretal apresentam áreas mucóides associadas, que
parecem estar associadas a um pior prognóstico.
O adenocarcinoma mucinoso pode ser diagnosticado
quando 50% ou mais do tumor é composto por
áreas mucóides. O adenocarcinoma de células em anel
de sinete apresenta um prognóstico pobre e
corresponde a 01% dos casos de tumores malignos do intestino
grosso. O adenocarcinoma colorretal pode ser
graduado em lesões bem diferenciadas (20%),
moderadamente diferenciadas (60%), pouco diferenciadas (18%)
e indiferenciadas (02%). O grau de diferenciação
está associado ao prognóstico, embora este fator seja
menos relevante que o estadiamento
(4,5,6,9,10,11). A classificação da borda/margem microscópica de
invasão como expansiva/arredondada ou infiltrante parece
ser um importante fator prognóstico em algumas séries.
A borda de infiltração dos adenocarcinomas é
caracterizada pelo crescimento tumoral sob a forma de
glândulas ou grupamentos celulares nos tecidos
normais circunjacentes. A borda de tipo infiltrante ocorre
em cerca de 20% a 25% dos casos. Fundamental na
avaliação histopatológica do adenocarcinoma
colorretal está a determinação das camadas intestinais
envolvidas (profundidade de invasão), a presença de
invasão neoplásica angiolinfática e/ou perineural e a
presença de metástases em linfonodos. O envolvimento
de linfonodos é provavelmente o mais importante
fator prognóstico. As chances de cura são menores
quanto maior o número de linfonodos envolvidos, e/ou na
presença de metástases em linfonodos junto aos
troncos vasculares. As classificações TNM, Dukes e
Astler-Coller são as mais freqüentemente utilizadas
no estadiamento do carcinoma colorretal
(4,5,6,7,8,9,12).
Com o objetivo de estimar a associação
entre metástases em linfonodos regionais e fatores
prognósticos como grau de diferenciação, tamanho
tumoral, presença de áreas mucoprodutoras, bordas do tumor
e idade, os autores avaliam cinqüenta casos distintos
de adenocarcinoma de intestino grosso.
MATERIAL E MÉTODO
1. Grupo de pacientes
O presente estudo transversal, analítico e
retrospectivo avaliou cinqüenta casos distintos
de adenocarcinoma de intestino grosso, avaliados
entre junho de 2006 e outubro de 2008, compreendendo
um período de estudo igual a 29 meses. Os casos da
amostra englobaram espécimes cirúrgicos de ressecção
parcial ou total do intestino grosso, sendo
previamente avaliados no laboratório de patologia do
Hospital Luterano, ULBRA. Todos os espécimes cirúrgicos
foram inicialmente fixados em formalina 10% e
incluídos em parafina. A pesquisa foi aprovada pelo comitê
de ética da Universidade Luterana do Brasil.
Para comprovação diagnóstica de
adenocarcinoma de intestino grosso, seguindo os critérios
histopatológicos determinados pela Organização Mundial da Saúde,
foram realizados cortes histológicos de 03
micrômetros de espessura para cada amostra, sendo submetidos
à coloração pela técnica de hematoxilina-eosina.
Todos os casos foram reavaliados por dois patologistas,
individualmente e em conjunto, havendo uma concordância de 100% entre o diagnóstico prévio e os
dados obtidos pelo estudo (razão do teste de Kappa igual
a +1). Foram excluídos do presente estudo todos os
espécimes que correspondiam apenas à biópsia de
intestino grosso, os espécimes de ressecção que
exibiram adenocarcinoma in situ de intestino grosso,
as amostras de polipectomia, todos os casos de
margens cirúrgicas proximal, distal ou radial
comprometidas, as amostras constituídas por demais tipos de
neoplasia primária do intestino grosso, todos os casos
de metástases para o intestino grosso, assim como o
produto de ressecções intestinais por doenças
não-neoplásicas.
Em cada caso foram determinados os seguintes dados anatomopatológicos:
- topografia da lesão: ceco, cólon
ascendente, cólon transverso, cólon descendente, cólon sigmóide
e reto;
- o tamanho do tumor: em centímetros, no
maior eixo da lesão;
- a configuração macroscópica do
tumor: vegetante, polipóide séssil, polipóide pediculado,
ulcerado, úlcero-vegetante e infiltrativo;
- grau de diferenciação: pouco
diferenciado, moderadamente diferenciado, bem diferenciado
e indiferenciado;
- profundidade de invasão: mucosa,
submucosa, muscular própria, subserosa, serosa, mesocólon,
tecidos perirretais e invasão de outros órgãos,
- borda de invasão microscópica:
arredondada/expansiva ou infiltrativa,
- presença de metástases em
linfonodos mesocólicos e/ou perirretais.
Cada caso avaliado foi também agrupado
quanto à presença de áreas mucoprodutoras e
ao estadiamento pelos sistemas TNM, Dukes e Astler-Coller.
2. TESTES ESTATÍSTICOS
A análise estatística deste trabalho foi
realizada através de tabelas e variáveis descritivas (média
e desvio-padrão), conforme os testes estatísticos
destacados a seguir.
Para verificar a associação entre a
presença de metástase e as outras variáveis de estudo
foram utilizados os Testes do qui-quadrado e o Teste
Exato de Fisher. Para a comparação da idade e o tamanho
do tumor entre os casos com presença e ausência
de metástase foi utilizado o teste t-student para
amostras independentes. Os resultados foram considerados
significativos a um nível de significância máximo de
5%. Para o processamento e análise dos dados
coletados foi utilizado o software estatístico SPSS versão 10.0.
RESULTADOS
Dentre os cinqüenta casos da amostra, a
idade média correspondeu à 63,7 anos, com uma
variação de 14,1 anos. Houve 26 casos no sexo
feminino (52%) e 24 casos no sexo masculino (48%). O
tamanho tumoral médio foi igual a 4,45 cm, com uma
variação de 2,13 cm.
A tabela 1 determina os dados obtidos em relação às seguintes variáveis: grau de
diferenciação, presença de áreas mucoprodutoras, tamanho
tumoral, borda microscópica, presença de metástases
em linfonodos regionais, topografia da lesão e
configuração macroscópica do tumor. A média de linfonodos
isolados dentre os cinqüenta espécimes cirúrgicos foi
igual a quatorze linfonodos.
Key words: Adenocarcinoma, colon, lymph nodes, pathology.
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Endereço para correspondência:
Prof. Dr. Eduardo Cambruzzi
Hospital Conceição de Porto Alegre
Av Francisco Trein, 596, 2° andar, Laboratório de Patologia
B. Cristo Redentor, Porto Alegre, RS
FONE / FAX: 51-3357-2164
E-mail: dudacambruzzi@yahoo.com.br
Recebido em 22/09/2009
Aceito para publicação em 18/12/2009
Pesquisa elaborada e realizada no Laboratório de Anatomia Patológica e Citopatologia do Departamento de Patologia da
Universidade Luterana do Brasil.