ARTIGOS ORIGINAIS
RAQUIANESTESIA COM MORFINA VERSUS RAQUIANESTESIA SEM MORFINA ASSOCIADA A BLOQUEIO DO NERVO PUDENDO. AVALIAÇÃO DA ANALGESIA E COMPLICAÇÕES EM HEMORROIDECTOMIAS
Spinal Anesthesia with Morphine Versus Spinal Anesthesia Without Morphine Associated to Pudendal Nerve Block. Evaluation of the Analgesia and Complications in Hemorrhoidectomy
1 Carlos Henrique Marques dos Santos; 2 FÁbio Tacla Saad; 3 Robson Luiz Silveira JarÁ; 4 Magali da Silva Sanches Machado
1 Mestre e Doutor em Medicina, Titular da Sociedade Brasileira de Coloproctologia, Titular do Colégio Brasileiro de Cirurgiões, Cirurgião Geral do Hospital Regional de Mato Grosso do Sul; 2 Residente de Cirurgia Geral do Hospital Regional de Mato Grosso do Sul; 3 Cirurgião Geral do Hospital Regional de Mato Grosso do Sul, Titular do Colégio Brasileiro de Cirurgia Digestiva; 4 Mestre e Doutora em Medicina, Cirurgiã Geral do Hospital Regional de Mato Grosso do Sul.
Resumo: INTRODUÇÃO: Recentemente, alguns autores têm relatado que o bloqueio do nervo pudendo com uso de ropivacaína proporciona boa analgesia pós-operatória. Assim, considerou-se de interesse a comparação de dois métodos anestésicos verificando a analgesia pós-operatória e as complicações. OBJETIVO: Comparar duas técnicas anestésicas (raquianestesia com morfina versus raquianestesia sem morfina associada com bloqueio do nervo pudendo) para hemorroidectomia quanto à analgesia pós-operatória e complicações. MATERIAIS E MÉTODOS: Foram estudados 40 pacientes provenientes do ambulatório de Coloproctologia do Hospital Regional de Mato Grosso do Sul no período de março a outubro de 2008. Todos os pacientes foram randomizados por sorteio imediatamente antes de se iniciar a intervenção cirúrgica e foram distribuídos em dois grupos: Grupo 1: 20 pacientes submetidos à raquianestesia com morfina com 0,15µg associado com bupivacaína hiperbárica 10mg; - Grupo 2: 20 pacientes submetidos à raquianestesia com bupivacaína pesada 10mg associado ao bloqueio do nervo pudendo bilateral com agulha para raquianestesia 27G utilizando ropivacaína 10mg/ml diluída em 10ml de água destilada. RESULTADOS: Avaliou-se 40 pacientes, sendo 21 do sexo feminino. A idade média foi de 52 anos, variando de 21 a 72 anos. Apenas no grupo 1 observou-se complicações, sendo a principal prurido, seguida de retenção urinária e cefaléia. Após 6 horas da cirurgia, a média do nível de dor foi 1,55 no grupo 1 e 1,4 no grupo 2. Após 12 horas da cirurgia as médias foram 1,75 e 0,15 nos grupos 1 e 2, respectivamente. CONCLUSÃO: A hemorroidectomia realizada com associação de raquianestesia sem morfina e bloqueio do nervo pudendo utilizando ropivacaína proporcionou melhor efeito analgésico no período de 12 horas após a cirurgia e não apresentou complicações nesta casuística, mostrando-se superior à raquianestesia com morfina.
Descritores: Hemorroidas, cirurgia, raquianestesia, complicações
INTRODUÇÃO
A doença hemorroidária acomete 4,4% da
população geral nos Estados Unidos, podendo ocorrer
em ambos os sexos1. Entre todas as modalidades do
tratamento da doença hemorroidária, a ressecção
cirúrgica parece ser a que melhor elimina os sintomas e
proporciona uma melhor qualidade de vida aos
pacientes2-3.
Levando em consideração que o
pós_operatório da hemorroidectomia é marcado pela
dor, muitas vezes intensa, fato que inibe os
pacientes de procurar tratamento, muitos fatores tem
sido analisados visando minimizar este sintoma.
Dentre eles a técnica (aberta, fechada, etc.), as
diferentes fontes de energia (bisturi frio,
eletrocirurgia mono ou bipolar, etc.) e a técnica anestésica
utilizada4.
O alivio da dor pós-operatória, além de
proporcionar maior conforto ao doente, pode também
diminuir o tempo de internação, os custos hospitalares
e pode proporcionar o retorno mais precoce às
atividades habituais5.
Diversos métodos analgésicos têm sido
preconizados para alívio da dor pós-operatória
em hemorroidectomias como a morfina subcutânea
com bomba de infusão, a estimulação elétrica
transcutânea, uso de corticoides, a infiltração perineal
com bupivacaína, bloqueio posterior do períneo e o
bloqueio da fossa isquiorretal, sem que, no entanto, tenham
efetivamente resolvido a questão com baixo custo e
fácil aplicabilidade2.
A hemorroidectomia é realizada na maioria
das vezes com raquianestesia ou anestesia
peridural, anestesia local com ou sem sedação e raramente
com anestesia geral. A raquianestesia com associação
de bupivacaína e morfina proporciona uma
excelente analgesia, sendo por isso bastante utilizada.
Entretanto, tem como um de seus maiores inconvenientes a
retenção urinária que pode chegar a até 20%,
postergando a alta destes enfermos e causando-lhes grande
desconforto6.
Recentemente, alguns autores têm relatado que o bloqueio do nervo pudendo com uso
de ropivacaína proporciona boa analgesia
pós-operatória6. Assim, consideramos de interesse a
comparação de um método anestésico tradicional
(raquianestesia com morfina), mas que apresenta efeitos
indesejados, com a raquianestesia sem morfina associada ao
bloqueio do nervo pudendo com ropivacaína, com
objetivo de comparar a analgesia pós-operatória e as
complicações.
OBJETIVO
Comparar duas técnicas
anestésicas (raquianestesia com morfina
versus raquianestesia sem morfina associada com bloqueio do nervo pudendo)
para hemorroidectomia quanto à analgesia e
complicações pós-operatórias.
MATERIAIS E MÉTODOS
O estudo foi aprovado pela Comissão de
Ética do Hospital Regional de Mato Grosso do Sul,
mediante informação completa sobre o estudo para o paciente
e assinatura do Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido. Não houve conflito de interesses.
Critérios de inclusão: idade maior de 13 anos
e hemorroidas de graus III ou IV.
Critérios de exclusão: idade menor de 12
anos, hemorroidas de grau I e II, hemorroidas de grau III
e IV associadas a outras doenças anais (fístulas,
fissuras, etc).
Foram estudados 40 pacientes provenientes do ambulatório de Coloproctologia do
Hospital Regional de Mato Grosso do Sul no período de março a
outubro de 2008. A idade variou de 21 a 72 anos, com média
de 52 anos. Foi administrado Cefoxitina 2g IV na
indução anestésica em todos pacientes. Os pacientes
foram randomizados por sorteio imediatamente antes de
se iniciar a intervenção cirúrgica, sendo distribuídos
em dois grupos:
- Grupo 1: 20 pacientes submetidos à raquianestesia com morfina 0,15µg associado
com bupivacaína hiperbárica 10mg, utilizando agulha
para raquianestesia 27G, sendo a punção realizada entre
L3 e L4, com o paciente sentado.
- Grupo 2: 20 pacientes submetidos à raquianestesia com bupivacaína pesada 10mg,
utilizando agulha para raquianestesia 27G, sendo a punção
realizada entre L3 e L4, com o paciente sentado. Após
a perda da sensibilidade perineal, com o paciente
em posição de litotomia, realizou-se o bloqueio do
nervo pudendo interno bilateral com agulha para raquianestesia 27G introduzida em raiz da coxa
posterior em direção à espinha isquiática
utilizando ropivacaína 10mg/ml diluída em 10ml de água
destilada, instilando-se 10 ml de cada lado.
A hemorroidectomia foi realizada por
técnica fechada com poliglactina 4-0 em todos os
pacientes. Utilizou-se no pós-operatório Dipirona 2ml IV a cada
6 horas e Cetoprofeno 100mg IV a cada 12 horas
para analgesia. Em caso de retenção urinária
realizava-se sondagem vesical de alívio.
Os resultados foram catalogados no
período de internação do paciente onde foram analisadas
as seguintes variáveis:
1. Dor pós-operatória (6h e 12h seguintes
ao procedimento), utilizando escala de dor de 0 a 10,
de acordo com a intensidade da dor, considerando-se 0
a ausência completa de dor e 10 dor de extrema
intensidade.
2. Complicações, onde se avaliou:
prurido, náuseas, vômito, cefaleia e retenção urinária.
Os resultados foram submetidos a tratamento estatístico pelo teste
t de Student, considerando-se significativo p<0,05.
RESULTADOS
No primeiro momento de avaliação
pós-operatória (6h) o nível de dor no grupo 1 variou de 0 a
4, com média 1,55. No grupo 2 houve variação de 0 a
7, com média 1,4 (tabela 1), demonstrando não haver
diferença entre os grupos (p=0,811).
ABSTRACT: INTRODUCTION: Recently, some authors have reported that the pudendal nerve block using ropivacaine provides good postoperative analgesia. Thus, we consider of interest to compare two anesthetic methods checking postoperative analgesia and adverse effects. OBJECTIVE: To compare two anesthetic techniques (spinal anesthesia with morphine versus spinal anesthesia without morphine associated with pudendal nerve block) for hemorrhoidectomy in relation to postoperative analgesia and adverse effects. MATERIALS AND METHODS: We studied 40 patients from Hospital Regional de Mato Grosso do Sul among March to October of 2008. All patients were randomized by lot immediately before surgery, distributed in two groups: Group 1: 20 patients undergoing spinal anesthesia with morphine 0.15µg associated with hyperbaric bupivacaine 10mg; - Group 2: 20 patients undergoing spinal anesthesia with heavy bupivacaine 10mg associated with bilateral pudendal nerve block with ropivacaine 10mg/ml diluted in 10ml of distilled water. RESULTS: Most patients were female (N = 21). The average age was 52 years, ranging from 21 to 72 years. The group 1 presented a higher prevalence of adverse effects (62.5%). Among the adverse effects of group 1 was higher prevalence of itch, urinary retention and migraine. Most patients who reported pain in the postoperative range from group 1 was male and prevailing in the first 12 hours, with the average level of pain of 1.55. In group 2 the pain was observed in equal proportion in both sexes and in the first six hours, with the average level of pain of 1.75. CONCLUSION: The hemorrhoidectomy accomplished with spinal anesthesia without morphine and blockade of the pudendal nerve using ropivacaine provided better analgesic effect in the period of 12 hours after the surgery and it didn't present complications in this casuistry, being shown superior to the spinal anesthesia with morphine.
Key words: Hemorrhoids, surgery, spinal anesthesia, complications.
Referências
1. Moreira JPT, Araújo SEA, Oliveira JR O. Diagnóstico
da hemorróida, Projeto Diretrizes. Rev Assoc
Med Bras 2007; 53(1): 10-11.
2. Imbelloni LE, Beato L, Beato C Cordeiro JA, Souza
DD. Analgesia pós-operatória com bloqueio bilateral do
nervo pudendo com bupivacaína S75:R25 a 0,25%. Estudo
piloto em hemorroidectomia sob regime ambulatorial. Rev
Bras Anestesiol 2005; 55(6): 614-21.
3. Nelson H. Ânus. In: Towsend , editor. Sabiston Tratado
de Cirurgia. 17.a ed. Rio de Janeiro: Editora Saunders
Elsevier 2005;49: 1490-1.
4. Moreira JPT, Araújo SEA, Oliveira Jr O. Hemorróidas:
Tratamento Cirúrgico. Rev Bras Coloproctol 2006; 2(16):1-10.
5. Lacerda Filho A, Cunha MJR. Hemorroidectomia em
regime ambulatorial sob anestesia local - Estudo prospectivo de
50 casos. Rev Bras Coloproct 1995; 15 (4): 206-10.
6. Gabrielli F, Cioffi V, Chiarelli M, Guttadauro A, Simone
M. Hemorrhoidectomy with posterior perineal block. Dis
Colon Rectum 2000; 43(6): 809-12.
7. Cruz GMG, Santana SKAA, Santana JL, Ferreira
RMRS; Neves PM, Faria MNZ. Complicações Pós-Operatórias
Cirúrgicas da Hemorroidectomia: Revisão de 76 Casos
de Complicações. Rev Bras Coloproct 2007; 27(1): 42-57.
8. Fillmann EEP, Fillmann LS, Fillmann HS, Pandolfo
G. Antibioticoprofilaxia no Tratamento Cirúrgico da
Doença Hemorroidária: Efeito Sobre o Controle da Dor
Pós-Operatória , Cicatrização das Feridas e Complicações. Rev
Bras Coloproct 2004; 24(1): 5-9.
9. Santos HA. Doença Hemorroidária. In: Cruz
GMG. Coloproctologia ii: coloproctologia propedêutica
nosológica. Rio de Janeiro: Editora Revinter 1999; 1139_56.
10. Cruz GMG, Ferreira RMRS, Neves PM.
Doença Hemorroidária _ Aspectos Epidemiológicos e Diagnósticos
de 9.289 Pacientes Portadores de Doença
Hemorroidária. Rev Bras Coloproct 2006;26(1): 6-23.
11. McConnel JC, Khubchandani IT - Long-term follow-up of
closed hemorrhoidectomy. Dis Colon Rectum 1983; 26:797-9.
12. Bleday R, Pena JP, Rothenberger. Symptomatic
hemorrhoids: current incidence and complications of operative
treatment. Dis Colon Rectum 1992; 35:477-8.
13. Kamphuis ET, Ionescu TI, Kuipers PW. Recovery of
storage and emptying functions of the urinary bladder after
spinal anesthesia wit lidocaine and with bupivacaine in
men. Anesthesiology 1998; 88:310-6.
14. Braum Filho LJ, Casado MRT. Analgesia x efeitos
colaterais de doses diferentes de morfina no espaço peridural. Rev
Med Aeronaut Bras 1985; 38(1): 345-7.
15. Imbelloni LE, Vieira EM, Gouveia MA, Cordeiro
JA. Raquianestesia posterior para cirurgias anorretais em
regime ambulatorial. Estudo piloto. Rev Bras
Anestesiol 2004;54(6):765-9.
Endereço para correspondência:
Carlos Henrrique Marques dos Santos
Rua: Aluisio de Azevedo, 606
Monte Líbano - Campo Grande, MS
CEP: 79004-050
Email: chenrriquems@yahoo.com.br
Tel: (67) 8157-7171
Recebido em 30/01/2009
Aceito para publicação em 14/03/2009
Trabalho realizado no Serviço de Cirurgia Geral do Hospital Regional de Mato Grosso do Sul.